segunda-feira, 28 de julho de 2008

Eu cresci!

Eu era uma criança. Acordava todas as manhãs e rezava o pai nosso ainda deitado na cama, sonhando com a partida de futebol que eu iria jogar na aula de Educação Física. Eu acordava ouvindo os passarinhos cantarem, e acreditava no que haviam me dito, que o canto dos pássaros era a voz de Deus. Ia à escola, e sabia que precisava estudar, ser um bom menino, tirar boas notas e ganhar presente do Papai Noel no final do ano porque havia passado por média. Ao chegar na escola, passava horas, durante a aula, olhando pela janela os pés de goiaba do sítio (sim, minha escola tinha um sítio), rezando para que chegasse a hora do recreio para “roubar” algumas goiabas, apenas pelo prazer da aventura de ser perseguido pelas irmãs, que brigavam com a gente por causa da travessura. Voltava pra casa ao meio dia, a pé, com a farda toda suja e suada de tanto jogar futebol e correr das freiras, e entrava em casa me escondendo da minha mãe para que ela não reclamasse de mim por ter sujado a farda em plena segunda feira, pois aquilo seria demais. Depois de não conseguir esconder a farda suja e ouvir os gritos e sermões maternos, eu tomava banho (mal tomado), almoçava e ia dormir, pensando em descansar para no fim da tarde ir jogar a pelada na praçinha próxima de casa com meus amigos, e me sair bem, já que no dia anterior eu tinha perdido o jogo pro meu “carrasco” e principal adversário, e aquilo não poderia acontecer de novo. Portanto, preocupado em estar descansado para obter bom desempenho na pelada e vencer o time do sujeito, eu dormia, e sonhava. Sonhava com campos verdes cheios de pessoas felizes, crianças como eu, brincando, correndo, ou sonhava com um quarto cheio de brinquedos, bolas de futebol profissionais, vídeo games, tudo de mais legal que pudesse existir. Ao acordar, fazia a tarefa escolar às pressas, e saía quase fugindo de casa para jogar bola na praçinha... muitas vezes ganhei, outras perdi, mas sempre fazia gols. É verdade, eu era bom! Chegava a noite e eu precisava ir para casa tomar banho e jantar, já pensando em sentar na frente da casa da menina mais bonita da rua e ir conversar com ela, afinal, quem sabe ela não queria namorar comigo? Mas ela era muito disputada... havia vários outros garotos tentando conquistá-la, e eu parecia ser o mais calado de todos, por isso, achava que nunca teria chances, e aquilo me entristecia. Quando aceitava minha incapacidade de ser mais competente que eles na conquista, saía pra conversar com os outros meninos ou voltava para casa a fim de jogar uma partida de futebol de botão com meu tio (eu sempre perdia), ou baralho com minha avó. Depois de perder no botão ou de ganhar no baralho, assistia um pouco de TV e ia pra cama, pois precisava acordar cedo no dia seguinte para ir para a aula, e isso era um saco. O que eu queria mesmo era ficar acordado até tarde conversando com os adultos, ou ficar na rua brincando de pique-esconde ou “jogo da verdade” com os meninos, mas minha mãe não deixava. E assim eram meus dias, cheios de alegria, brincadeiras, algumas angústias infantis, e outras preocupações mais infantis ainda. Assim eu tinha amigos, tinha paqueras, conversava, brincava, sorria e não tinha medo de ser feliz.


Hoje sou adulto. Acordo cedo, preocupado com a conta que não consegui pagar do mês passado... isso quando consigo dormir, quando ela não me tira o sono! Tenho que ir trabalhar, sofrer pressão dos chefes, e ainda preciso me preocupar com a faculdade que está por começar e eu ainda não consegui dispensar a disciplina que eu já paguei no outro curso. Não almoço mais com minha mãe, não jogo mais futebol de botão com meu tio e nem baralho com minha avó. Também não saio a noite tentando conquistar a menina mais bonita da rua, nem brinco de pique-esconde, nem jogo bola na praça. O meu principal rival passou a ser eu mesmo, e minha vida se resumiu às minhas angústias, dores, inquietações e solidões. Tenho medo de olhar para frente, e quando durmo, não consigo mais sonhar. Depois de tantas decepções, tenho medo de fazer amizades, tenho medo de sofrer num relacionamento e tenho medo de perder minha identidade. Não há mais praças perto da minha casa, e nem há mais sítios na minha escola. Também não posso mais andar a pé, porque de tanto que fui obrigado a judiar do meu corpo, ele não resiste mais a tanto esforço, e quando resiste, eu tenho medo de não chegar em casa inteiro. Estou sitiado sim, mas sitiado pelo medo, pela violência, pela tristeza e por todos os males que o mundo ao meu redor me proporciona. Perdi a inocência infantil que me trazia a felicidade, e convivo com uma série de cobranças e anseios que para mim não passam de egoísmo e vaidade. Saio a noite e não tenho mais a certeza de voltar para casa e dormir chateado por não poder ficar mais tempo na rua. Hoje eu posso ficar o tempo que eu quiser, mas questiono o preço dessa minha “liberdade”, pois não sei que espécie de liberdade é essa que pode levar embora a alegria de viver das pessoas. Eu cresci, e tive que resumir meu mundo de sonhos a um mundo interior, porque caso contrário, não sobreviveria. Tive que me tornar mais um, tive que mentir algumas vezes, tive que ser egoísta, tive que exigir mais dos outros do que eles podiam oferecer, porque se não fizesse isso, a “máquina” me atropelaria. Deixei de ser eu mesmo porque o mundo me obrigou a isso... infelizmente, o mundo não é o mesmo! Hoje eu quase não tenho amigos, as conquistas ficaram tão fáceis que perderam o sentido de ser, e eu não sei mais se posso dizer que sou feliz.


Agora eu sou adulto, tenho liberdade, e posso fazer o que eu quiser, mas sinceramente, preferia que não fosse assim.

41 comentários:

Ana Karenina disse...

Pois, meu caro. A vida é uma faca de dois gumes.

Abraço.

Anônimo disse...

Meu querido, li o teu post anterior sobre a transposição do rio São Francisco, e quero dizer que fizeste uma abordagem profunda dentro das tuas convicções. Este é um assunto altamente polêmico e que, me parece, ainda vai se arrastar por muito tempo para que haja uma solução satisfatória.

Existe muita verdade na frase com que abres o artigo: "É necessário que as pessoas resgatem urgentemente o senso humanitário, e acima de tudo, o amor ao próximo." Talvez tudo se tornasse um pouquinho mais fácil se os responsáveis por obras deste quilate pudessem olhar para além das suas questões políticas e pessoais.

Quanto à postagem atual... li, reli, e me pareceu ouvir a voz de tantos outros jovens que, como tu, perderam a capacidade de 'resgatar' os sonhos que enfeitaram a infância... sabendo que muitos deles não tiveram nem uma infância onde estes sonhos pudessem um dia ter se formado... Confesso que não sei o que te dizer, meu anjo, pois muitas vezes as palavras 'esperança' e 'fé' em que as coisas vão melhorar, caem no vazio. Existe tanta desesperança no mundo! Muitas vezes eu me sinto assim também, e confesso a ti que não sei onde busco forças para novamente voltar a acreditar.

Portanto, meu anjo, deixo-te apenas meu carinho e solidariedade, e um beijo do meu para o teu coração.

Mariana disse...

Discordo quando vc diz ue agora tm liberdade....

Acho que conforme a gente cresce, a gente vai tolindo a nossa propria liberdade.

Criança pode tudo... Para o mundo dela, aquilo que ela pode é tudo.

Me doeu muito a passagem da infancia para adolescencia...

beijos

*Raíssa disse...

"O meu principal rival passou a ser eu mesmo, e minha vida se resumiu às minhas angústias, dores, inquietações e solidões."
O pior é que é mesmo...

Quando somos crianças, tudo é mais fácil, tudo é mais feliz. Não temos quase nenhuma responsabilidade a não ser fazer o dever de casa. O mundo adulto dá medo mesmo.

Beijos

Nadezhda disse...

Quando se é criança, dá uam certa vontade de ser adulto pra ser livre. Mas elas não sabem que a liberdade está ali mesmo ;)

Igor Isídio disse...

Vinícius!
Antes de qualquer comentário, devo dizer que foi o texto que mais me tocou, em todos os blogs, até agora. Sem dúvidas, merece meus mais sinceros aplausos.
Vivo numa fase de transição entre a primeira e a segunda parte do texto e ainda não sei o quanto essa mudança vai me transformar.
A melhor vida que se pode ter é a de criança, mas só quando amadurecemos passamos a perceber isso.
Abração!

meus instantes e momentos disse...

vim para conhecer, gostei.
Parabens post, bem feito, inteligente.
Belo blog
Uma boa semana
Maurizio

Idylla disse...

presente p tuuuuu bjoo =)

Luifel disse...

Cara, não tenho o que dizer desse texto, ele merece os mais sinceros aplausos. Excelente mesmo. Velho, me identifiquei com muitas coisas nesse texto e tenho que ser concorde com vc em quase tudo.

Sofri com a passagem da infancia para a idade adulta e sempre tenho, no fundo, um pouco daquela sindrome de Peter Pan sabe? No fundo as vezes todo mundo tem isso, quer voltar aos seus 6,7,8,9 anos de idade e descobrir q apesar de tudo nessa fase é que se era feliz!

Abç!

Unknown disse...

perfeeeeito!
adorei!


"e quando durmo, não consigo mais sonhar."

resumiu tudo

bju

Camila disse...

Aiii que saudade da minha infancia que me deu!
hahah

eu adoraavaaaa

Layana. disse...

Continua escrevendo muito bem!

Kamilla Barcelos disse...

Adoro post q nos faz lembrar tb de nossa infância! Sua descrição é tão perfeita, q a cada linha q leio vira um filme em minha mente!
Sinto um pouco como vc, nostalgia da época de criança.

Anônimo disse...

Conversamos muito sobre isso né?

Como eu sinto falta do tempo que eu era feliz sem precisar de motivos.

Eu li e reli seu texto, achei tão lindo, apesar de triste. Eu queria estar aí perto de vc, para poder ao menos amenizar suas angústias e inquetações. Não sei o que dizer, as palavras fugiram.

Dizem que quando todas as palavras belas se perdem dentro de nós, é porque sentimos uma vontade louca de dizer tudo, para nunca dizer adeus.

Muita força! Tente encontrar os resquícios de criança que ainda existem em vc. Tenho certeza que vai encontrar ao menos sombra deles dentro de ti, tente resgatar.

Sabe que te amo demais, posso não estar ao seu lado, mas estou sempre com vc.

Um abraço apertado!

Beth Carolina disse...

Vina... saudade de passar por aqui.

Crescer tem lá suas complicações, mas quantas coisas boas descbrimos somente quando somos adultos!!!!

Bjs

T disse...

Eu concordo com você. O que a gente mais quer quando criança é crescer, quando adolescente, tirar a carta, ter liberdade, e quando adquirimos tudo isso, desejamos somente estar dormindo na nossa cama, esperando uma aula de abecedário pro dia seguinte. É tudo muito cruel. Esse mundo faz umas coisas com a gente, que me dói demais.

Anônimo disse...

aiiii
deprimi...
=(
num sei nem oke dizer...
=(

Dani disse...

Tbm tenho saudades da infância viu...
Apareça amigo!!!
bjs

Camila disse...

ah simhahahaha eu tento ter um pensamento maduro hahaha
MAS ADOORO TER MEU JEITINHO MOLECA!
Essas coisas a gente aprende com a convivencia com pessoas mais sábias! =)


beijooos querido

Fraan - disse...

Nossa...flou tdo, nem tenho oq comentar...

Passarei mais veezes =**

Idylla disse...

q bom q gosta do meu blog! pq tb gosto muito daki...rsrsrs
Minha prox. postagem será c as ftos da viagem........

bjoo =)

ah! viu o selinho q te dei ne?

Mandy disse...

Saudades da infância... Qnd não tinhamos preocupações, éramos felizes e não sabiamos. Hj nos preocupamos D+ e acabamos deixando de viver, ou pelo menos deixamos de tentar. Isso é errado, mas o q nos aprisiona a esse mundo cheio de medo, angústias e falsas esperanças q nunca aparecem? Espero um dia poder encontrar realmente a felicidade e espero q ela tbm chegue para vc, pois apesar de não nos conhecermos pessoalmente, saiba q vc já tem um espaço no meu coração!!!!

BjO.

Flávia Fabri Cesário disse...

Quando criança queria ser adulta.
Agora qeu sou adulta quero minha infância de volta!
O ser humano nunca está satisfeito com o que tem. Logo, o desejo de querer de volta o que tinha, o desejo de ter o que não pode...
Quando era criança me imaginava o quanto seria perfeito ter 18 anos e a tãos onhada liberdade! No meu aniversário de 18 percebi que nada iria mudar, a não ser o acúmulo de responsabilidade, por ter de decidir meu futuro através de uma profissão. Mundo complexo e cheio de obstáculos e armadilhas. Neste momento eu percebi que ser criança era muito melhor. Poderia ser autêntica, dizer o que sentia, o que pensava, sem meias palavras, sem ter noção de convenções e regras de boa etiqueta.
O ruím é que a cada dia, as crianças são menos crianças. Daqui uns anos elas não sentiram este tipo de saudade que nós sentimos.
Beijos, Vini!!!

Camila disse...

Nossa... ser criança é tão mais fácil!
Ai ai..
=/

Anônimo disse...

nossa *----------*
que texto divinoo
escrevee perfeitamentee beem auauha
ameei ameei


http://imensidadx3.blogspot.com/

Zek disse...

Ahh que inveja do Peter Pan, nunca crescer ...

abraços !!

Ariana Coimbra disse...

"O meu principal rival passou a ser eu mesmo, e minha vida se resumiu às minhas angústias, dores, inquietações e solidões. Tenho medo de olhar para frente, e quando durmo, não consigo mais sonhar. Depois de tantas decepções, tenho medo de fazer amizades, tenho medo de sofrer num relacionamento e tenho medo de perder minha identidade."

MEDO:Ta ai um sentimento constante em minha vida, realmente qdo se perde a inocência de uma criança se perde tudo!

Amei o texto, um dos melhores que já li no seu blog, e olha que são todos bons!

Beijão*

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

Ah, texto super legal!
É muito bom lembrar dos tempos em que você não precisava se preocupar com nada, a vida era bem mais simples né? cheia de sonhos, desejos...
Eu ainda estou em fase de transição...nem criança,nem adulta...
mas confesso que às vezes queria ter meus 6, 7 anos e poder retornar aquela fase em que nada me tirava o sono. Aquela fase em que minha vida era bem mais alegre e simples...

Bjos!

Paula Barros disse...

Voltarei Vinicius, pelo adiantado da hora e o cansaço não conseguiria ler bem lido, assimilar.
Voltarei. abraços

*Raíssa disse...

Já falei pra minha amiga que se tiver uma versão II do filme, a gente TEM que ver! hahaha

Pelo menos a continuação tem que ser boa né, porque o final foi péssimoo!

Beijos

Anônimo disse...

nino...que saudades..aparece no meu cantinho...
seeus texto continuam divinamnte bons...fico ate sem palavars pra comemtar,..pq vc tira tds elas de mim....!
xerrooo!

Flávia disse...

eu faço questão de não crecer. De permanecer com meus pés descalços, de sair de casa no meio da chova para dançar entre os pingos d'água, de subir nas árvores, de gargalhar alto sem motivo. Hoje eu sou mais cirança do que quando eu era criança - porque hoje eu sei a importância dessas pequenas coisas, e descobri que a infância é algo que a gente tem que optar viver, independente da idade.

Lindo o texto.

Beijo!

Paula Barros disse...

Vinicius
Respiro antes de comentar. Páro.
Esse seu texto, esse relato, será imrportante, assim penso, para o resto da sua vida.
Reflete dois momentos de vida, infância e adulto. Outros momentos virão. Então a questão é, como fazer diferente para num futuro você não olhar esses dois momentos passados e ver que poderia ter feito mais, principalmente por você, pelo seu bem-estar, por sua qualidade de vida.
Valores introjetados, pelo texto, percebo que tens muito.
O caminho, as suas próprias reflexões já estão mostrando. A sua sensibilidade será sua guia.
Siga...viva...seja...
abraços e um bom final de semana.

Camila disse...

oBRIGADA POR TER VOTADO! =)

TEM HISTÓRIA NOVA!

Laysla Fontes disse...

Porque você me deixa tão sem jeito com seus elogios?

Muito obrigada, Vinícius! (:

Tatah Marley's Confissões disse...

Perfeito!
x)
é exatamenteeee assim!
eu, mesmo com 17 anos passo por tanta coisa, que daria (quase) TUDO pra voltar a infancia.. foi sim a melhor epoca da minha vida!

adorei!
muuuuito!
;*

Renato Ziggy disse...

Doeu ler isso, cara. Mas é o que mais acontece e me esforço vez ou outra pra não me contaminar. Até que dá certo, por mais que nada seja a mesma coisa...
Abraço!

Camilla disse...

"Agora eu sou adulto, tenho liberdade, e posso fazer o que eu quiser, mas sinceramente, preferia que não fosse assim".

Posso falar?
Disse T U D O.

Olirum disse...

Tornar-se adulto apenas na idade não adianta nada, pq vc tem que ter maturidade pra arcar com as consequências e responsabilidades que a idade traz!

Bom fds.

Ana Luíza disse...

Obrigada amigooooooo... Prometo ñ demorar +...
XEROOOOO